Voltámos ao medo porque ele nunca nos deixou.
Tentámos esquecê-lo, dentro de casa, com a nossa família, mas ele acaba sempre a voltar.
Este vírus desconhecido, porque não se vê, não se sabe onde está, não o controlamos, dá-nos um sentimento de impotência que nos torna inseguros, frágeis, receosos e sem darmos conta, através de gestos, expressões faciais, movimentos do corpo, demonstramos e transmitimos ao outro a ansiedade e o medo que nos invadiu.
Com as crianças, que são especialistas em captar e absorver sensações e emoções, exprimidas em gestos, por muito que possamos repetir que "Vai ficar tudo bem", a mensagem que passa é dúbia, promovendo insegurança e medo nas crianças.
Só conseguiremos transmitir confiança e ajudar as crianças, a ultrapassar os seus medos, se aprendermos antes a assumir os nossos e a lidar com eles.
Nas crianças os medos funcionam também como etapas de desenvolvimento, ao ultrapassar cada etapa, elas vão reforçando a sua autonomia e estrutura emocional.
São chamados os medos infantis e estão relacionados com situações que a criança sente, que não controla e que vão variando com a idade.
Entre os 2 e os 6 anos os medos mais comuns são o medo do escuro, o medo de monstros e de fantasmas, o medo de "ladrões" e de "maus" e o medo de perda/separação.
Entre os 6 e os 11 anos, surgem os medos de catástrofes naturais, de guerras, de doenças e epidemias, bem como o medo da exposição ao outro (ex.: falar em público).
Devemos estar alerta para os sinais que as crianças nos dão (fazer chichi na cama, pesadelos, insónias, dor de barriga, ansiedade, irritabilidade, etc.) pois elas nem sempre falam abertamente do que estão a sentir, mas o comportamento não-verbal pode nos revelar muita coisa.
Desvalorizar, minimizar ou ignorar a situação não ajuda a resolvê-la. Mas também empolá-la, torná-la o centro de uma conversa ou dramatizá-la vai dificultar a resolução do problema.
É fundamental o equilíbrio. Ajudar as crianças a vencer e a controlar o medo e, acima de tudo, a não ter medo de ter medo; ensinemos-lhes que a melhor maneira de o ultrapassar não é evitá-lo, mas sim enfrentá-lo e contrariá-lo.
É importante proporcionar às crianças experiências de confronto com as situações geradoras de medo, ensinando-lhes "truques" que as façam sentir-se tranquilas (respirar fundo e pausadamente, descontrair os músculos fazendo exercícios de relaxamento, afugentar pensamentos "maus", substituindo-os por outros agradáveis) e simultaneamente oferecer-lhes o nosso apoio físico (abraço, dar a mão, afagar a cabeça) e verbal ("estás a conseguir", "estou aqui contigo para te ajudar").
Cada vitória sobre o medo deve ser comemorada e valorizada. À medida que as crianças se tornam mais capazes e confiantes, deixemo-las lidar sozinhas, com autonomia e coragem, com os seus medos. Estaremos sempre por perto e vigilantes, mas não nos esqueçamos que a nossa função é dar as ferramentas para serem felizes e saudáveis.
É na tranquilidade que a maior tempestade perde a força.
Cuidem-se, Protejam-se, para melhor vencermos esta batalha.
Sofia Melo Marques